quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Contos do Sr. Quadrado - A Epifania [03]

O Sr. Quadrado acabava de garantir uma vaga de emprego numa grande empresa multinacional. Era uma noite especial e ele estava se preparando para sair de casa comemorar com família e amigos essa nova fase em sua vida. Pobre coitado, na verdade não tinha noção do que seria essa "fase".

Já um pouco atrasado, e pra piorar, nervoso por não encontrar as chaves do carro. Procurou em todos os lugares possíveis e impossíveis, mas não achava. Estressado e sem forças, sentou no sofa completamente desolado. Depois de um tempo, ao observar a mesinha no meio da sala, viu a bendita chave.

Ao ver a chave na mesa, bem a sua frente, teve uma epifania. Um momento de iluminação, um pensamento extremamente complexo diante de um momento simples do cotidiano. Tudo que sempre procurou, assim como a chave, estava bem na sua frente, todavia não conseguia ver. O que procurava era ele mesmo. Não uma busca espiritual barata, vendida por alguns livros de auto-ajuda com menos conteúdo que uma embalagem de papel higiênico, mas algo real e palpável. Precisava de uma vida nova baseada verdadeiramente no que acreditava, sem hipocrisias, ou pelo menos quase sem.

Mesmo sem deixar de comparecer ao jantar, seus pensamentos divagavam em outro lugar. Se o leitor me permitir descrever o Sr.Quadrado com um neologismo, nesses momentos de séria dissonância cognitiva que vivia (antes de partir), era então homem "idéia-fixa". Porém só idéias, sem planos, pois como ele mesmo dizia: fazer planos muitas vezes nos dão a impressão errada que temos o controle do futuro em nossas mãos.

Passavam-se os dias. Já não suportava tudo aquilo. Toda aquela situação, a vida que vivia já não fazia mais sentido. Era necessária uma mudança e deveria ser radical. Tinha que deixar tudo pra trás, ainda que temporariamente. Tudo que sempre foi, enclausurado dentro de si mesmo, agora deveria aflorar. Não era viver a vida que "todos querem", baseando-se em luxos ou sonhos pré-produzidos em massa por uma sociedade capitalista, e sim viver e fazer o que precisava ser feito (sei que não ficou bem claro, mas lá na frente vai ficar), ou seria perseguido o resto da vida pela culpa de não viver conforme sua própria natureza, mas conforme os outros esperavam ou impunham.

Uma manhã de Sol radiante, poucas semanas após o "incidente", o futuro mochileiro errante partiu...

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