segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Contos do Sr. Quadrado - Um Estudo em Vermelho [2] (2-2)

Sob aquela situação complicada, uma resposta inesperada de vaias e uma figura que ainda não tinha dado suas caras. Era o homem que mandava e desmandava naquele lugar, era José. Quando a pequena multidão percebeu sua presença, mudou o coro de vaias para um "E agora José?". O Sr.Quadrado ficou perplexo e sem entender nada, afinal até agora desde quando chegara na vila não tinha ouvido falar no sujeito. José se aproximou dele e o chamou para conversar em um lugar menos tumultuado, a sua casa. Chegando lá, após educadamente oferecer um café, Zé (como pediu para ser chamado) começa a falar:

- Você está louco? esta lenda existe nessa vila a muito mais tempo do que você existe nesse mundo. Por acaso não tens respeito pelos mais velhos?

- Mas é claro que tenho - respondeu o Sr.Quadrado mesmo confuso com a coerência da pergunta - só que a lenda não é uma pessoa, é uma mentira, e você deve saber disso pois parece ser um homem esclarecido!

- Esclarecido? dependes do que quer dizer. Se for sobre minha cor de pele obviamente sou, pois tu mesmo têm olhos pra ver isso. Quanto ao outro significado creio que também sou. Mas façamos o seguinte, você sai dessa vila hoje e tudo volta ao normal. Aqui é um lugar perigoso, acidentes estranhos acontecem de vez em quando sabe? se precisar de dinheiro para continuar sua jornada pra sei lá aonde eu posso te ajudar, mas deve sair hoje daqui!

O Sr.Quadrado percebendo a situação de ameaça, não aceita o dinheiro, mas aceita sair. É claro que só pra sair dali, não da vila, pois não iria deixar tudo como estava, fingindo que nada aconteceu. Pensou num plano. Tomou a decisão: devia usar sua camisa vermelha na frente de todos na vila e desafiar a morte. E foi o que fez.

No dia seguinte após dormir pelas redondezas da vila, fazendo todos acharem que havia ido embora, o Sr.Quadrado volta com sua camisa vermelha e lança ao ar suas palavras para todos ouvirem, lança um desafio a tal maldição da morte. Afinal sua camisa não possuía os elementos tóxicos das camisas vermelhas que eram confeccionadas ali na vila, então em tese estaria a salvo. Mas será que sua ousadia não teria um preço?

Não foi preciso muito tempo pra saber a resposta dessa pergunta. Ouve-se um estrondo. Algumas pessoas pensaram ser um trovão pois o céu estava escuro e ameaçando chuva, outras que a maldição havia escolhido seu alvo, mas o Sr. Quadrado ao sentir seu peito queimando estranhamente por dentro, confirma o que mais temia: havia levado um tiro.

Começa a chover. Seu sangue escorre e se mistura com a água. O vermelho, tão temido naquele lugar, se mistura com toda paisagem. O momento e sua poesia lembram uma cena de filme, apesar de dramática e triste. De repente o tempo parece parar e tudo se desfaz.

...

O Sr.Quadrado acorda. Foi tudo um sonho, ou melhor, um pesadelo. Após largar tudo o que tinha e se lançar ao mundo, essa foi a primeira noite mal dormida do seu êxodo. Era seu primeiro dia fora de um sistema e de uma sociedade que chamava de casa, mas mal esperava ele que o pesadelo não chegava nem perto do que ele iria enfrentar nessa jornada.

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